Sem
mandato judicial, Polícia Militar de MG e guarda municipal da Prefeitura de
Belo Horizonte despejam 150 famílias de ocupação em Belo Horizonte, MG.
Nota
de repúdio à violência perpetrada pela PM de MG e pela GM/PBH a 150 famílias
pobres de MG.
REPRESENTAÇÃO
AO MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS, áreas de Direitos Humanos e de Assuntos
Comunitários.
Dia
25/10/2013, a Polícia militar de Minas Gerais e a Guarda Municipal de Belo
Horizonte, semelhante ao que fizeram na Ocupação Zilah Spósito/Helena Greco há
3 anos atrás, foi arbitrária, agiu de forma ilegal, truculenta e se comportando
como jagunços disfarçados de policiais e funcionários públicos. Entre a Vila
Corumbiara e Vila Pinho, na região do Barreiro, em Belo Horizonte, MG, cerca de
150 famílias ocuparam há dez dias um grande terreno abandonado. Tentavam sair
da cruz do aluguel, veneno que come no prato dos pobres, e da cruz que é
sobreviver de favor, uma humilhação. Mas na manhã do dia 25/10/2013, dezenas de
policiais militares de MG chegaram à Ocupação e sem mandato judicial, de forma
truculenta, ilegal e imoral, expulsaram as famílias sem-casa e sem-terra que
estavam no local. O povo foi enxotado sob a mira de fuzis e armas de grosso
calibre, com bombas, spray de pimenta e gás lacrimogêneo. Quatro pessoas foram
presas: uma vovó, a senhora Meire; um adolescente, um policial do exército e um
jovem que voltava do trabalho.
Sem
nenhum critério objetivo ou mandato judicial que justificasse esta ação
violenta da PM/MG e GM/PBH, foi usada força desproporcional contra mulheres,
idosas, gestantes, pessoas com deficiência visual e crianças recém nascidas que
foram atacadas por policiais do sexo masculino. Não bastasse a covardia
desencadeada sob o comando do Major PM Natan, comandante da 12ª CIA da PMMG
localizado no Vale do Jatobá, região oeste da Capital, uma criança de 14 anos
foi conduzida no xadrez da viatura junto com adultos e permaneceu presa no
quartel do bairro Vale do Jatobá até as 09 (nove) horas da noite e após conduzida
pela viatura da PM até a delegacia de menores do Bairro Barro Preto, permanecendo presa até tarde da noite. Essas
verdadeiras barbaridades cometidas contra o povo pobre, acontecem pela segunda
vez na região do Barreiro. Em maio de 2012, policiais comandados pelo Major
Natan, ainda quando este era capitão, também cometeram diversas agressões
contra os moradores do assentamento ELIANA SILVA na mesma região, o qual foi
denunciado na Comissão de Direitos Humanos da ALMG e ao Ministério Público da
área de Direitos Humanos pela conduta violenta e abuso de autoridade, ações
essas que ainda continuam impunes e abrem caminho para mais agressões. Ato
contínuo, o advogado Elcio Pacheco, membro da Comissão de Direitos Humanos da
OAB/MG, foi acionado pelos moradores para que intervisse na prisão das pessoas
dentro de um quartel, o qual foi agredido verbal e fisicamente pelo SGT ZILVANE
e CABO WIMERSON, subordinados do MAJOR NATAN, os quais o empurraram para fora
da sala onde eram confeccionados os Boletins de Ocorrência, no momento em que o
advogado havia indagado sobre as ilegalidades de se prender pessoas dentro de
um quartel e da permanência de uma criança, também presa junto com adultos e da
proibição pelos PMs ao advogado consultar com os presos. Mas qual foi o motivo
que justificasse as prisões? Nenhum. Somente para tentar intimidar o povo que
se dispersou sob a ação militar que semeou o terror na região.
Em
entrevista a frei Gilvander Luís Moreira, uma mãe, dona Maria Neuza Barbosa, disse:
“Meu filho é cego. Entramos na ocupação
porque não suportamos mais sobreviver em um único cômodo, cedido, por favor, pela
dona Neuza. A gente estava almoçando na barraca e, de repente, bombas começaram
a explodir ao lado da nossa barraca, que era já nossa casa, esperança de uma
vida nova. Foi um sufoco enorme ter que fugir correndo com meu filho cego sob
tiros e gritaria. Meu filho e eu temos direito de viver em paz. Como pode fazer
isso também com uma criança cega?” A criança cega é José Reinaldo, aluno de
uma Escola Municipal de Belo Horizonte. A mãe acrescentou: “Eu vesti a camisa da Escola no meu filho
para verem que ele estudante e está lutando para melhorar a vida.”
Outra
mãe, dona Maria de Lourdes, disse: “Sou
mãe de 11 filhos. Tivemos que ocupar, porque não temos para onde ir, porque
estão exigindo o barraco onde a gente vive. Não temos condições mais de pagar
aluguel. Onde vou viver com meus 11 filhos?”
Um
jovem, com um olho avermelhado, disse: “Um
policial gritou comigo “Suma daqui. Não encoste em mim.” Eu disse ao policial
que eu tenho que respeitá-lo, mas ele tem que me respeitar também. “Do mesmo jeito que não
posso encostar em você, você policial, também não pode encostar em mim.” Nessa
hora, jogaram uma bomba ao meu lado. Por isso meu olho está vermelho e ardendo.
A bomba caiu próxima de uma criança de 15 dias. Deve ter arrebentado os ouvidos
dela. Isso é um absurdo. A polícia não respeita mais nem criança.”
Por
isso, uma criança de 15 dias de vida foi ferida e teve que ser levada para o
hospital. Uma bomba, lançada pela PM, explodiu ao lado da barraca onde estava a
criança. Imagine o sistema auditivo dessa criança sendo danificado por essa
bomba! Representantes da PBH tentaram cooptar uma pessoa que se apresentou como
liderança, oferecendo indenização para ela com a condição de que ela não mais liderasse
o povo para reocupar a área.
Fiscais
da PBH agrediram inclusive mulheres grávidas de 8 meses. Um rapaz trabalhador
que chegava do serviço apanhou da polícia sem motivo algum. Bombas explodiram
ao lado de criança, de idosas que, ao correr, caíram. Um rapaz que tem platina
no tornozelo, ao correr das bombas, caiu em um buraco e, provavelmente, terá
que operar novamente o tornozelo.
A
prefeitura de Belo Horizonte, que se diz proprietária da área tenta justificar
o despejo dizendo que se trata de área ambiental. Primeiro, a maior parte do
terreno não é área ambiental. Segundo, os terrenos que “são da prefeitura de
BH” na região do Vale do Jatobá até início da década de 90 do século XX eram
terras públicas, do Governo Estadual. Foram repassados para empresas por preço
irrisório, sem licitação e com cláusula contratual que exigia a construção de
empreendimento industrial que gerasse emprego na região no prazo de 12 ou 24
meses. Diziam que seria criado o Distrito Industrial do Vale do Jatobá, mas
mais de 20 anos se passaram e muitas empresas não cumpriram a cláusula
contratual, ficaram especulando com os terrenos. Por isso há várias Ações Civis
Públicas, da Defensoria Pública e do Ministério Público, arguindo a anulação
dos contratos e o retorno dos terrenos ao Governo de MG. Basta o Governador de
MG, Sr. Antônio Anastasia, reconhecer a nulidade dos contratos e destinar os
terrenos para um grande programa habitacional popular. Na época, como
compensação ambiental, vários terrenos foram doados para a Prefeitura de BH.
Por isso é que a PBH diz ter terrenos lá na região. Enfim, se os contratos
forem anulados, a PBH poderá também perder a titularidade desses terrenos.
Logo, a propriedade dos terrenos por parte da PBH é questionável. Mais grave
ainda: A PBH é responsável, ao lado dos Governos estadual e federal, pelo
cumprimento da Constituição que prescreve moradia para todos como um direito
constitucional. Se os poderes públicos não viabilizam moradia popular para o
povo, é óbvio que o povo tem o direito e o dever de ocupar os terrenos
abandonados, que não cumprem sua função social.
Um
comandante da PM, olhando na direção de uma liderança que chegou após o
despejo, gritou e repetiu: “Se alguém
estimular a violência aqui, será preso.” A esse comandante e a todos os policiais
de MG (50 mil soldados da PM e 10 mil da polícia civil) sugerimos a leitura do
livro Pedagogia do Oprimido, de Paulo
Freire, de 1967, mas atualíssimo. Lá vemos, por exemplo, que quem inicia a
violência não são os oprimidos, mas os opressores. Logo, comandante, quem está,
mais do que estimulando a violência, está sendo violento é a classe dominante,
e com ela o Estado, que não respeita a Constituição, que protege de forma
absoluta a propriedade que não cumpre sua função social e reprime os pobres quando
esses se unem e, de forma coletiva e organizada, lutam por seus direitos. Por
isso, comandante, prenda quem realmente “estimula” a violência: os empresários especuladores
e gestores públicos que usam e abusos dos poderes públicos para beneficiarem particulares
e submeterem milhões de famílias à cruz do aluguel ou à humilhação que é
sobreviver de favor. Comandante, mais do que enxugar gelo, saiba que a polícia
ao reprimir lutas coletivas por direitos humanos jamais fará justiça. Sempre
agravará o problema social, pois a repressão aumenta a indignação. O Povo dá um
passo atrás, mas retorna com mais força para a luta. Policiais, recordem que
vocês são da classe trabalhadora. É asqueroso pessoas cumprirem ordens injustas
que violentam quem vem sendo violentado a conta-gota. A lei maior do Deus da
vida diz: Não matarás! E se mata de muitas formas. Viver crucificado pelo
aluguel ou por sobreviver de favor também mata. Rebelião contra esta engrenagem
que violenta a dignidade humana é algo ético, justo e necessário.
Como
documentos, apresentamos, abaixo, os links de três vídeos que atestam a
veracidade dos fatos apresentados e denunciados aqui nessa nota.
1) PM de MG e Guarda Municipal de Belo
Horizonte, sem mandato judicial, com truculência, despejam 150 famílias:
2)
150
famílias são despejadas, sem mandato judicial, ao lado da Vila Corumbiara, em
Belo Horizonte:
3) PM de MG prende avó, um soldado do
exército, um adolescente e um trabalhador, ilegalmente e de forma truculenta.
Pelo
exposto, acima, exigimos:
1)
Que o Ministério Público de MG apure as
arbitrariedades e tome as medidas judiciais necessárias para punir comandantes
e policiais que agiram fora da lei;
2)
Do Prefeito Márcio Lacerda, do Governador de
MG, Sr. Antonio Anastasia, e da Presidenta Dilma exigimos moradia digna para
todas as famílias que estão crucificadas pelo aluguel ou pela humilhação que é
sobreviver de favor.
3)
Que todas essas famílias que foram despejadas
sejam reassentadas em casas ou apartamentos do Programa federal Minha Casa,
Minha Vida;
Belo
Horizonte, MG, Brasil, 28 de outubro de 2013
Contatos para maiores informações:
Com
Leo, cel.: 31 9133 0983 ou Poliana, cel.: 31 9283 9027
Assinam essa Nota,
Comissão
Pastoral da Terra – CPT
Movimento
de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas – MLB
Rede
Nacional de Advogados Populares – RENAP.
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