RECOMENDAÇÃO DA DEFENSORIA
PÚBLICA DE MG À POLÍCIA MILITAR DE MG PARA EVITAR DESPEJOS ARBITRÁRIOS, VIOLENTOS E SEM
ALTERNATIVA DIGNA PARA AS OCUPAÇÕES ROSA LEÃO, ESPERANÇA E VITÓRIA EM BELO
HORIZONTE.
Recomendação 03/2013/DPDH
Assunto: observância de providências mínimas para assegurar a integridade psicofísica, saúde, vida e patrimônio dos envolvidos em eventual cumprimento de reintegração de posse coletiva a ser realizada com apoio policial perante as Comunidades Rosa Leão, Vitória e Esperança no Município de Belo Horizonte.
Poder
Executivo Estadual
Comando
Geral da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais
Ao
Excelentíssimo Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais
Senhor
Márcio Martins Sant’Ana
DEFENSORIA PÚBLICA DO
ESTADO DE MINAS GERAIS, instituição autônoma,
integrante do Sistema Constitucional de Justiça, nos termos do art. 134 da
Constituição da República, por intermédio da DEFENSORIA ESPECIALIZADA DE
DIREITOS HUMANOS, COLETIVOS e SOCIOAMBIENTAIS, por seu órgão de execução infra-assinado,
vem, mui respeitosamente, no
exercício de suas atribuições institucionais de promoção da tutela preventiva
dos direitos coletivos das comunidades carentes nominadas de Rosa Leão, Vitória e Esperança,
situadas em Belo Horizonte, notadamente no curso de eventual cumprimento de reintegração de posse, discutidas em
diversas ações judiciais em trâmite na Comarca de Belo Horizonte como as de
números 2427246-06.2013.8.13.0024, 3042606-29.2013.8.13.0024 etc, apresentar a presente RECOMENDAÇÃO, nos termos e pelos fundamentos fáticos e
jurídicos que se seguem:
CONSIDERANDO que a Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe, como expressão e
instrumento do regime democrático, a orientação,
a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, dos direitos coletivos das pessoas necessitadas, por meio da adoção de quaisquer espécies de medidas, judiciais
ou extrajudiciais, notadamente em
prol de grupos que mereçam especial
proteção do Estado em decorrência de sua vulnerabilidade econômica (atividade típica), jurídica, social ou
organizacional (atividade atípica), na forma dos art. 5º, LXXIV e 134 da
Constituição da República, 1º e 4º, III, VII, VIII, X e XI e § 5º da Lei Complementar 80/1994, 4º e 5º, XII e § 3º da
Lei Complementar Estadual 65/2003, 1º, IV, 5º, II e 21 da Lei 7.347/1985, 81,
parágrafo único, II e 82, IV da Lei 8.080/1990;
CONSIDERANDO que a Defensoria Pública tem exatamente
como finalidade assegurar o pleno acesso
à ordem jurídica justa (Kazuo
Watanabe), sendo instrumento de promoção da isonomia material, justiça
social, e voltada para o apoio
comunitário, com estímulo à
organização popular, como sinaliza o art. 1º da Lei Complementar 80/1994;
CONSIDERANDO que à Defensoria Pública compete
promover, prioritariamente, a solução harmoniosa e pacífica dos litígios por meio de técnicas de composição e administração de
conflitos, conforme se extrai dos art. 4º, II e § 4º da Lei Complementar
80/1994 e 5º, I da Lei Complementar Estadual 65/2003;
CONSIDERANDO que é função institucional da Defensoria Pública o exercício do múnus público da curadoria especial, mister este realizado especificamente no âmbito
das ações de reintegração de posse coletiva passiva supra apontadas movidas em
desfavor de mais de 4.000 (quatro mil)
famílias carentes, por força do art. 4º, XVI da Lei Complementar 80/1994, 5º, VIII e 45, XIII, LC Estadual
65/2003, 9º e 231, I do Código de Processo
Civil;
CONSIDERANDO que é prerrogativa dos membros da
Defensoria Pública atuar em favor de seus assistidos, independentemente de procuração, já que sua capacidade postulatória é inerente
(in re ipsa), por decorrer
diretamente da Constituição, segundo dispõem os art. 4º, §§ 6º e 128, XI da LC
80/94, 74 XI da LC Estadual 65/03;
CONSIDERANDO que as funções institucionais da Defensoria Pública são exercidas contra as Pessoas Jurídicas de
Direito Público, inclusive, consoante o § 1º do
art. 5º, da Lei Complementar Estadual 65/2003;
CONSIDERANDO ser
dever constitucional do Estado de velar pela preservação dos direitos
fundamentais (e humanos) à vida (art.
5º, caput),
incolumidade psicofísica, saúde (art. 6º
e 196), segurança (art. 5º, caput,
6º e 144) e moradia (art. 6º), os quais
gravitam em torno (e visando a consecução) do valor central da dignidade da
pessoa humana (art. 1º, III);
CONSIDERANDO que
o princípio da máxima efetividade dos
direitos e garantias fundamentais, previsto no art. 5º, § 1º da Constituição, afasta a
vetusta concepção da Lei Maior como mera “Carta de Intenções” permeada de
normas programáticas sem concretude;
CONSIDERANDO que o art. 620 do Código de Processo
Civil[1] prevê, na esteira do princípio da menor onerosidade possível (sem afastar o
da efetividade), a realização dos atos de execução nos processos
judiciais da maneira menos gravosa
possível aos executados, incluindo as medidas de apoio como a requisição
policial, em consonância com art. 273, § 3º,
461[2], 475-I 579[3] do
mesmo Diploma e os princípios do devido processo legal formal e material (art. 5°, LV da CR/88), cooperação, lealdade e boa-fé processual;
CONSIDERANDO que o moderno processo civil
constitucional, a despeito da defasagem legislativa do Codex de 1973
quanto à instrumentalização dos direitos fundamentais, impõe, na linha do vigente constitucionalismo
contemporâneo, a adequação de seu procedimento às normas
irradiadas da Carta Magna, notadamente em matéria de conflitos possessórios
multitudinários, conforme ensina a melhor doutrina[4];
CONSIDERANDO
que as diretrizes internacionais sobre
procedimentos práticos mínimos a
serem observados em remoções coletivas, consignadas em documentos editados pela Organização
das Nações Unidas - ONU e em tratados de direitos humanos, dentre os quais
se destaca o Relatório da Relatoria Especial para o Direito à Moradia Adequada sobre
Megaeventos de 2010 da ONU[5], e perfilhado pelo Ministério Público Federal[6], impõem, à luz da proporcionalidade
e razoabilidade (devido processo legal substantivo) a informação prévia aos envolvidos da data do despejo; a sua realização durante o dia e em razoáveis condições
climáticas; a presença de agentes
públicos durante o seu cumprimento; a identificação
dos responsáveis pela remoção e a
adoção de precauções para evitar que sejam gerados desabrigados, assegurando o Poder
Público reassentamento dos removidos;
CONSIDERANDO a
Lei Estadual 13.604/2000[7],
referendada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais[8],
que instituiu Comissão Especial, composta
por membros dos 03 Poderes, para acompanhar os trabalhos dos despejos coletivos[9],
incluindo as respectivas “operações policiais”, atualmente integrada pelos
Eminentes Desembargador Antônio Armando Flores, Secretários de Estado de
Desenvolvimento Social Cássio Antônio Ferreira Soares e de Desenvolvimento Regional
e Política Urbana Olavo Bilac Pinto Neto e Deputado João Leite, conforme
ofícios GAB.GOV 138/2012 da Governadoria do Estado e GAB.SEC. 862/2012 da
Secretaria de Estado de Minas Gerais anexos;
CONSIDERANDO a
Diretriz para a Produção de Serviços de Segurança Pública 3.01.02/2011 deste
Colendo Comando Geral da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais[10],
que prevê a formação de um Comitê
Permanente de Crises para acompanhar a atuação policial nas reintegrações
em massa, bem como a disponibilização de ambulâncias,
a instalação de salas de enfermaria, imprensa e alojamentos, dentre outros aparatos;
CONSIDERANDO a
aplicação analógica do Manual de
Diretrizes Nacionais para Execução de Mandados Judiciais de Manutenção e
Reintegração de Posse Coletiva do Departamento de Ouvidoria Agrária e Mediação
de Conflitos do Ministério do Desenvolvimento Agrário que prevê a imperiosa necessidade de articulação da
Polícia Militar nas reintegrações de posse com a Defensoria Pública, Ministério
Público, Prefeitura Municipal, OAB, Conselho Tutelar, entre outras entidades,
para participem do planejamento, negociações e cumprimento da decisão, sendo vedada
a destruição de benfeitorias e viabilizado local para destinação das
pessoas desalojadas e seus pertences;[11]
CONSIDERANDO a Recomendação 22/2009 do Conselho
Nacional de Justiça que visa um acompanhamento
mais diligente das demandas de reintegração de posse, utilizando-se de
medidas capazes de evitar ações violentas e conflitos com os ocupantes;
CONSIDERANDO a aplicação do
princípio da não violência no
cumprimento de reintegrações de posse, com proibição
e restrições, respectivamente, no manejo
das armas de alta e de baixa letalidade, a teor da Resolução 08/2013 do
Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana da Secretaria de Direitos
Humanos da Presidência da República;
CONSIDERANDO os princípios da legalidade, necessidade,
moderação, proporcionalidade e conveniência no uso da força pelos agentes de
segurança pública, conforme previsto na Portaria Interministerial
4.226/2010 do Ministério da Justiça e da Secretaria de Direitos Humanos;
CONSIDERANDO os limites e responsabilidade na atuação dos ilustres membros da Polícia
Militar dispostos no Código de Ética e Disciplina dos Militares do Estado
de Minas Gerais (Lei Estadual 14.310/2002);
CONSIDERANDO a prevalência da verbalização e da
progressividade no eventual uso da força pela Polícia Militar, nos termos o
Decreto 3664/2002 do Comando Geral da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais
(que aprova Manual de Prática Policial, Volume I, da Polícia Militar);
CONSIDERANDO as limitações e cuidados exigidos na utilização
de armas de baixa letalidade dispostos no Caderno Didático do Curso de
Extensão em Equipamentos Não-Letais II do Departamento da Polícia Federal;
CONSIDERANDO
os limites no emprego de armas de baixa
letalidade dispostos pelos respectivos manuais dos fabricantes;
CONSIDERANDO que, apesar de se reconhecer certa melhora (apesar de ainda bastante
tímida e incipiente) na atuação articulada
dos entes públicos nas desocupações coletivas, ainda assim, recorrentemente não têm sido observadas
as diligências de praxe míninas supra
apontadas na sua operacionalização, pondo em risco a ocorrência de trágicos
resultados sociais, seja na cidade ou no campo;[12]
CONSIDERANDO que nos últimos dias tem sido
verificada intensa incursão de
policiais militares do Batalhão de Choque e do Grupo de Ações Táticas Especiais
- GATE na região, inclusive à noite e finais de semana, períodos em que, via de
regra, é vedada qualquer operacionalização prática para cumprimento de medida
judicial (art. 172, CPC), e mediante emprego de helicópteros com rasantes,
ocasionando acirramento de ânimos em todos os envolvidos, bem como trauma
psicológico nas crianças;
CONSIDERANDO tratar-se de aglomeração
populacional carente composta por mais de 4.000 (quatro mil) famílias (e não
somente pessoas), com diversas crianças, idosos e mulheres, implicando eventual
cumprimento de reintegração de posse em uma ação extremamente complexa e delicada, a merecer toda cautela e parcimônia possíveis para evitar
ocorrência de feridos e danos materiais em relação a quaisquer dos envolvidos
na sua efetivação, não tendo chegado ao conhecimento desta Instituição qualquer
notícia atuação articulada da Comissão Especial, Comitê Permanente de Crises e
as entidades supra referenciadas, incluindo Defensoria Pública;
CONSIDERANDO que
a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais acredita que a interlocução
entre as instituições públicas é meio eficaz para a promoção da dignidade da
pessoa humana (art. 1º, III, CR/88);
RESOLVE expedir a presente RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA,
referente a hipotético cumprimento de ação de reintegração de posse nos
terrenos onde se encontram as Comunidades Rosa Leão, Vitória e Esperança, para,
mui respeitosamente, alertar sobre a inafastável necessidade
de que:
1- seja viabilizado acompanhamento pela Comissão Especial prevista na Lei
Estadual 13.604/2000 das medidas de operacionalização e cumprimento do mandado,
antes, durante e imediatamente após, inclusive in loco, cientificando os respectivos membros a respeito das datas
e horários das reuniões e diligências a serem adotadas para efetivação das
respectivas decisões judiciais;
2-
seja efetivamente
instalado o Comite de Prevenção de Crise,
com realização de reunião (ões) prévia (s), assegurada a participação da
Comissão Especial, Conselho Tutelar, Defensoria Pública, Ministério Público, Secretarias
Municipal e Estadual de Saúde e de Assistência Social etc, visando a devida articulação
para garantia de uma desocupação pacífica e mediada, com a disponibilização de ambulâncias e equipes de enfermaria, informando-se a todos da data precisa para
cumprimento da medida judicial, cuja efetivação deverá ser preferencialmente
documentada por filmagens por qualquer deles;
3-
seja articulado com o Poder
Executivo de Belo Horizonte a disponibilização de albergues provisórios com capacidade e qualidade mínimas suficientes para
atender desabrigados e locais de depósito dos pertences;
4-
seja articulado com o Conselho Tutelar de Belo Horizonte para que este atue
nas negociações, antes, durante e após a desocupação, fornecendo serviço de
assistencia social às crianças e adolescentes desalojadas;
5-
os membros da Colenda Polícia
Militar do Estado de Minas Gerais utilizem
a respectiva tarjeta de identificação
durante a operação;
6-
não seja procedida quaisquer
medidas de implementação de reintegração de posse, ainda que preliminares,
consistentes em mapeamento da área, monitoramento mediante sobrevôo de
aeronaves etc em dias não úteis em período compreendido entre 22:00 horas e
06:00 horas;
7- seja viabilizada e aguardada prévia e exaustiva tentativa de saída
pacífica dos ocupantes antes do efetivo implemento efetivo do apoio
policial;
8-
o uso da força física seja realizado somente
em extremado e último caso, após esgotadas todas as tentativas de saída pacífica
e negociada das pessoas a serem removidas;
9-
não sejam
utilizadas armas convencionais (alta letalidade) e que se evite
ao extremo o emprego de armas de baixa
letalidade, as quais somente poderão ser utilizadas, em hipóteses excepcionalíssimas, para repelir injusta, atual e grave agressão e visando
estritamente resguardar a integridade
física dos envolvidos, após exauridos
outros meios menos gravosos, e de
forma gradativa, proporcional e moderada, iniciando-se sempre por aquelas de menor grau
de lesividade, e com emprego restrito em desfavor de homens e mulheres adultos
e sadios, excluindo-se, assim, sua
utilização em crianças, adolescentes, gestantes, idosos, enfermos, deficientes
e profissionais que estejam a trabalho durante a operação (Oficial de Justiça,
membros das forças de segurança pública, do Conselho Tutelar, de Comissões,
Conselhos e Comitês de Direitos Humanos, da Pastoral da Terra, Magistrados,
Parlamentares, Defensores Públicos, Promotores de Justiça, advogados, médicos,
enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, profissionais da imprensa e
demais autoridades e agentes públicos a trabalho);
10- a utilização de espargidores de agente químico oleoresin capsicum ou capsaicina (espuma de pimenta) somente ocorra nas excepcionais hipóteses dispostas no item 9 supra, respeitando-se
distância mínima de segurança de 1 ou 5 metros em relação ao atingido, a
depender do modelo da arma empregada (respectivamente, GL 108/E e GL 108/E
MAX);
11- não
sejam utilizadas municões de
elastômero (impacto controlado ou “borracha”), ainda que apenas contra os
membros inferiores.
Encaminhe-se ao Excelentíssimo Comandante
Geral da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, externando-lhe os
cumprimentos e saudações de estilo e a confiança de que a manutenção de uma
interlocução coordenada e preventiva entre todas entidades públicas citadas é
medida indispensável para a resolução pacífica e saudável dos conflitos
fundiários, evitando-se prejuízos à integridade psicofísica de qualquer dos
particulares e agentes públicos envolvidos.
Belo Horizonte, 27 de setembro de 2013.
Dr. Lucas Diz Simões, Defensor Público da Defensoria Pública do estado de Minas Gerais, área de Direitos Humanos, MADEP 710
[1] “Quando por vários meios o credor
puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso
para o devedor.”. Dispositivo aplicável por força do art. 644 do Código de
Processo Civil. Segundo Daniel Assumpção: “A execução não é instrumento de exercício de
vingança privada, como amplamente afirmado, nada justificando que o executado sofra
mais do que o estritamente necessário na busca da satisfação do
direito do exequente. Gravames desnecessários à satisfação do direito
devem ser evitados sempre que for possível satisfazer o direito por meio
da adoção de outros mecanismos. Dessa constatação decorre a regra de que, quando
houver vários meios de satisfazer o direito do credor, o juiz mandará que a
execução se faça pelo modo menos gravoso ao devedor. [...] O que se
pretende é evitar é o exagero desnecessário de tais gravames.” (Manual
de Direito Processual Civil. 2ª Ed. RT:
São Paulo, 2010 p. 736 - estilo sublinhado não consta do original).
[2] “Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento
de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica
da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem
o resultado prático equivalente ao do adimplemento. [...] § 5o Para
a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático
equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas
necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e
apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de
atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.” (estilo
sublinhado não consta do original).
[3] “Art. 579. Sempre que, para efetivar
a execução, for necessário o emprego da força policial, o juiz a
requisitará.” (estilo sublinhado não consta do original).
[4] “Havendo conflito fundiário de caráter coletivo,
o tratamento processual da ação possessória necessariamente
sofrerá adaptações. O processo civil é fértil na tutela coletiva dos
conflitos de massa, mas não se atualizou na defesa de direitos
individuais objeto de agressão coletiva. [...] pouco se comenta a
respeito dos aspectos substanciais e processuais da tutela jurisdicional
coletiva passiva. [...] Diante de um conflito agrário de ocupação de terras por
um complexo de famílias, a resolução da demanda deverá levar em
consideração novos ingredientes, sobremaneira direitos fundamentais.
Note-se que o Poder Judiciário posiciona-se, de regra, de maneira tradicional,
[...] olvidando argumentos de índole constitucional.” (FARIAS. Cristiano Chaves
de. ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Reais, V 5, 8ª Ed. Juspodivm:
Salvador, 2012 p. 232-234 - estilo sublinhado não constam do original).
[5] “32. Quando os despejos
são justificados, devem-se levar a cabo com estrito cumprimento das disposições
pertinentes dos instrumentos internacionais de direitos humanos e em
conformidade com os princípios gerais de sensatez e proporcionalidade. Em particular,
devem se aplicar as seguintes proteções processuais: a) dar a
oportunidade de autênticas consultas aos afetados; b) notificar de
maneira adequada e razoável todas as pessoas afetadas, antes
da data prevista para o despejo; c) proporcionar informação, no momento
oportuno e a todos os afetados, sobre os despejos propostos, e quando se o
proceda, sobre a finalidade para a qual se quer utilizar determinada terra ou
moradia; d) devem estar presentes funcionários governamentais ou seus
representantes durante os despejos, especialmente quando se trate de grupos de
pessoas; e) todas as pessoas que levem a cabo um despejo devem estar
adequadamente identificadas; f) os despejos não devem se realizar em más
condições climáticas ou à noite, a menos que assim concordem as pessoas
afetadas; g) devem ser proporcionados recursos legais; h) deve ser fornecida,
quando for possível, assistência letrada às pessoas que a necessitem
para pedir reparação aos tribunais. Mesmo quando os despejos sejam justificados
e sejam efetuados conforme as proteções processuais apropriadas, não
devem ter como consequência deixar as pessoas sem teto, e cabe ao Estado
adotar medidas adequadas,
dentro do máximo de recursos de que dispõe, para proporcionar moradia,
reassentamento ou acesso a terra produtiva.” (estilo sublinhado não consta do
original).
[6] Em recomendação expedida pelo Parquet Federal ao Estado de Minas
Gerais no cumprimento de reintegração de posse no Município de Itabira, apontou
a Instituição Ministerial que: “Preocupa-nos
o fato de que os despejos forçados, por si só, possuam efeitos
profundos e duradouros na vida das famílias atingidas [...] É
necessário que se resguarde a dignidade das populações antes,
durante e após a realocação, com medidas que assegurem os
direitos das famílias atingidas na observância dos padrões mínimos
internacionais de direitos humanos destacados a seguir [...] as remoções e
os despejos forçados são considerados ilegais quando realizados com o
uso de força física ou violência. Nenhuma remoção deve ser
realizada sem o acompanhamento de funcionários públicos
devidamente identificados, que devem efetivamente zelar pela segurança
da população que está sendo removida; observadores independentes
devidamente identificados devem estar presentes para garantir que não sejam
utilizadas força, violência ou intimidação; [...] a remoção não pode: fazer uso
da violência e da intimidação, em nenhuma circunstância; ser realizada de forma
discriminatória ou replicar padrões discriminatórios; Resultar em pessoas e
famílias desabrigadas; destruir os bens das famílias afetadas; Ignorar a
situação específica de mulheres e grupos em condição de vulnerabilidade
(idosos e crianças, assim como outros)” (domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=2129. Acessado em 31.01.2013, às
09:32 horas. Estilo sublinhado não consta do original).
[7] “Art. 1º - Fica criada comissão especial para acompanhar os
processos de desocupação de áreas invadidas para assentamento rural
ou urbano no Estado. § 1º - A comissão especial será composta de três membros,
designados pelo Governador do Estado, que representarão os Três Poderes, sendo
o do Legislativo e o do Judiciário indicados, respectivamente, pelos
Presidentes da Assembléia Legislativa e do Tribunal de Justiça. § 2º - A
comissão de que trata esta lei estará presente nas operações policiais que
visem à desocupação de áreas invadidas para assentamento rural ou urbano.” (estilos negrito e sublinhado não
constam do original).
[8] “Fundado nestas razões, dou provimento parcial ao
recurso somente para ordenar a observância da Lei Estadual nº
13.604/2000, na qual determina-se que o processo de desocupação de áreas
invadidas para assentamento urbano será objeto de acompanhamento por
comissão especial.“ (AI 0221249-40.2010.8.13.0000,
1ª C. Cv., rel. Vanessa Verdolim Hudson
Andrade, dje 08.10.2010 – estilo sublinhado não consta do original). “Determino, por fim, que, no cumprimento da
decisão, sejam observados todos os procedimentos previstos em Lei,
inclusive aqueles determinado na Lei Estadual 13.604 de 2.000.” (AI 1.0024.07.501472-0/001, 15ª
C. Cv., rel. Maurílio Gabriel, dje 10.09.2007 – estilo sublinhado não consta do
original).
[9] “Art. 1º - Fica criada comissão especial para acompanhar os
processos de desocupação de áreas invadidas para assentamento rural ou
urbano no Estado. § 1º - A comissão especial será composta de três membros,
designados pelo Governador do Estado, que representarão os Três Poderes, sendo
o do Legislativo e o do Judiciário indicados, respectivamente, pelos
Presidentes da Assembléia Legislativa e do Tribunal de Justiça. § 2º - A
comissão de que trata esta lei estará presente nas operações policiais que
visem à desocupação de áreas invadidas para assentamento rural ou urbano.”
[10] “7 CONDUTA OPERACIONAL[...]
7.2 EXECUÇÃO
[...] 7.2.6 Contatos com autoridades
envolvidas na solução do conflito Ao receber a ordem de desocupação, o responsável
pela operação articulará com os demais órgãos da União, Estado e Município
(Ministério Público, INCRA, ITER-MG, Ouvidoria Agrária Regional do INCRA,
Ouvidoria Agrária Estadual, Ouvidoria do Sistema de Segurança Pública,
Comissões de Direitos Humanos, Prefeitura Municipal, Câmara Municipal, Ordem
dos Advogados do Brasil, Delegacia de Polícia Agrária, Defensoria Pública,
Conselho Tutelar e demais entidades envolvidas com a questão
agrária/fundiária), para que se façam presentes durante as negociações e
eventual operação de desocupação. [...] 7.2.9 Emprego operacional [...] 7.2.9.3 Providências Essenciais Durante o
Emprego Policial Todos os esforços operacionais
devem convergir para que se esgotem as possibilidades da resolução
do conflito, sem o emprego da força, devendo para isso: a) Esgotadas todas
as formas e alternativas de solução pacífica da questão, no caso de
autorização de emprego de força necessária para garantir a ordem judicial, solicitar
a presença do Comitê Permanente de Crise para participar ‘in loco’ da ação
policial.[...] f) serão mantidas ambulâncias em cada setor ocupado
pela Polícia Militar, devendo estar em condições de deslocamentos para socorros
de urgência; [...] r) no perímetro tático externo serão instalados sala de
enfermaria, imprensa, Comitê Permanente de Crise, Posto de Comando,
almoxarifado, Delegacia Adida (quando necessário), alojamentos e o
que mais for necessário ao sucesso da operação; [...] t) o Comitê
Permanente de Crise é o órgão consultivo que avaliará os resultados
das negociações, emitindo parecer para subsidiar a decisão do Comandante
da Força-Tarefa; [...] 7.6
Comitê Permanente de Crise [...] 7.6.2 O comitê poderá ser
constituído com os seguintes órgãos e autoridades: Comandante da Força Tarefa,
Poder Judiciário, Ministério Público, representante do Poder Executivo do
Município, Procurador do Estado ou do município, Juizado da Infância e
Adolescência, Conselho Tutelar, ITER, INCRA/MG, FUNAI/MG, Polícia Federal,
Corpo de Bombeiros Militares, representante da Comissão de Direitos Humanos da
Assembléia Legislativa de Minas Gerais, Delegado de Polícia da Delegacia da
circunscrição, Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente,
Conselho Estadual de Direitos Humanos, Coordenadoria Estadual da Defesa Civil e
Coordenadoria de Defesa Civil do Município, dentre outros. 7.6.3 Cabe ao Comitê
Permanente de Crises analisar a situação e apresentar sugestões que possam
subsidiar as decisões relativas à execução das atividades. 8. PRESCRIÇÕES DIVERSAS [...] pontos considerados fundamentais e que devem
ser fielmente observados por todas as Unidades da Polícia Militar no
cumprimento das requisições judiciais de força policial, para cobertura aos
executores das reintegrações de posse em todo o Estado: a) efetuar os contatos
necessários com os demais Órgãos de Defesa Civil de modo a obter, dentre
outras informações, aquelas imprescindíveis sobre como ficará a situação dos
ocupantes após a realização da operação;”. (estilo sublinhado não consta do
original).
[11] “2 - DAS PROVIDÊNCIAS INICIAIS Ao receber a ordem
de desocupação o representante da unidade policial articulará com os demais
órgãos da União, Estado e Município (Ministério Público, Incra, Ouvidoria
Agrária Regional do Incra, Ouvidoria Agrária Estadual, Ouvidoria do Sistema de
Segurança Pública, Comissões de Direitos Humanos, Prefeitura Municipal, Câmara
Municipal, Ordem dos Advogados do Brasil, Delegacia de Polícia Agrária, Defensoria
Pública, Conselho Tutelar e demais entidades envolvidas com a questão
agrária/fundiária), para que se façam presentes durante as negociações e
eventual operação de desocupação. 3 – DOS LIMITES DA ORDEM JUDICIAL O
cumprimento da ordem judicial ficará limitado objetiva e subjetivamente ao que
constar do respectivo mandado, não cabendo à força pública responsável pela
execução da ordem ações como destruição ou remoção de eventuais benfeitorias
erigidas no local da desocupação. A força policial limitar-se-á a dar segurança
às autoridades e demais envolvidos na operação. Se o oficial de justiça
pretender realizar ação que não estela expressamente prevista no mandado, o
comandante suspenderá a operação, reportando-se imediatamente ao juízo
competente. Trata-se de ato administrativo vinculado. 4 – DA DOCUMENTAÇÃO DOS
ATOS DE DESOCUPAÇÃO As operações deverão ser documentadas por filmagens, o que
deve ser permitido pela polícia a qualquer das entidades presentes ao ato. 5 –
DO PLANEJAMENTO E DA INSPEÇÃO [...] Considera-se iniciada a execução da ordem
judicial a partir do momento que forem levantados dados para o planejamento. As
informações serão repassadas aos demais órgãos envolvidos com o
cumprimento da medida, reportando-se ao magistrado sempre que surgirem fatores
adversos. O responsável pelo fornecimento de apoio policial, com o intuito de
melhor cumprir a ordem judicial, adotará as seguintes providências, com a
participação dos demais envolvidos na solução do conflito: [...] II – comunicar
à Ouvidoria Agrária Regional do Incra para tentar viabilizar área
provisória para a qual os acampados possam ser removidos e prédios
para eventual guarda de bens, bem como os meios necessários para a
desocupação [...] 7 – DO USO DE MÃO DE OBRA PRIVADA PARA A REMOÇÃO A polícia
não permitirá, nem mesmo com utilização de mão de obra privada, desfazimento de
benfeitorias existentes no local ou a desmontagem de acampamento durante o
cumprimento da ordem judicial, salvo pedido de retirada voluntária de objetos
pelos desocupados da área objeto da lide. 8. DO USO DE MEIOS COERCITIVOS PATRA
A DESOCUPAÇÃO A tropa responsável pela desocupação restringirá o uso de cães,
cavalos ou armas de fogo, especificamente ao efetivo encarregado pela segurança
da operação, controle e isolamento da área objeto da ação.” (estilo sublinhado
não consta do original).
[12] Verbi gratia, no cumprimento de reintegração de posse realizado
contra a Comunidade Eliana Silva, em Belo Horizonte, da qual se originou “denúncias” de atuação policial com
contingente, logística e conduta desproporcional,
tendo sido objeto de apuração pela 18ª Promotoria de Direitos Humanos da
Capital, bem como de falta de disponibilização de serviços públicos de
assistência social adequados para acolhimento (processo
1088298-22.2012.8.13.0024). A não formação da Comissão Especial da Lei Estadual
13.604/2000 também ensejou de repercussão negativa na Assembleia Legislativa de
Minas Gerais (requerimento 3122/2012 e ofício 1.487/2012/SGM da Comissão de
Direitos Humanos). Vários outros são os exemplos de
resultados trágicos, decorrentes da falta de precauções mínimas no cumprimento
de remoções forçadas coletivas, o que e pretende evitar, como aqueles
verificados em Corumbiara, Eldorado dos Carajás e, mais recentemente, em
Pinheirinho, interior de São Paulo e em Timóteo, Minas Gerais. A falta de acompanhamento quanto
à observância dos direitos humanos na desocupação do Pinheiro configurou-se em
mancha negativa na imagem internacional da República Federativa do Brasil, o
que poderia ter sido evitado se tivesse havido uma maior supervisão de
entidades de direitos humanos. “Organizações não governamentais (ONGs)
encaminharam hoje (31) à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização
dos Estados Americanos (OEA) relatório denunciando violações de direitos
humanos que teriam ocorrido durante a desocupação da área conhecida como
Pinheirinho, no município de São José dos Campos (SP). A reintegração foi feita
pela Polícia Militar, em cumprimento a decisão da Justiça estadual de São Paulo”
(noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/01/31/ongs-denunciam-caso-pinheirinho-a-oea-e-onu.htm).
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