sábado, 25 de julho de 2015

31 Irregularidades jurídico-políticas atinentes à região da Izidora, segundo o Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular.

31 Irregularidades jurídico-políticas atinentes à região da Izidora, segundo o Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular.

 

Na Operação Urbana Simplificada do Isidoro (o nome correto é Izidora, mulher negra escravizada e alforriada que lavava roupa no ribeirão que ganhou seu nome) e nos quatro processos judiciais que envolvem diretamente todas as famílias das Ocupações da Izidora, em Belo Horizonte e Santa Luzia, MG, há 31 ilegalidades e inconstitucionalidades,que seguem sintetizadas a seguir:

1º) Não foi comprovada a posse da área!Não é possível juridicamente pedir reintegração de posse sem que nunca tenha sido exercida a posse. É inclusive reconhecido amplamente o abandono centenário da região por parte dos ditos proprietários, os quais somente fizeram juntar títulos de propriedade cuja cadeia dominial encontra-se hoje alvo de severos questionamentos.

2º)  Não foi franqueado acesso aos autos das reintegrações de posse para a Defensoria pública do Estado de Minas Gerais(DPE/MG) e Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MP/MG) pela juíza Luzia Divina, titular da 6ª Vara da Fazenda Pública Municipal da comarca de Belo Horizonte, órgão onde correm as ações de reintegração de posse contra as famílias das ocupações da Izidora. Assim ocorreu a inobservância dos princípios processuais constitucionais da ampla defesa, do devido processo legal e do contraditório.

3º) Há sérias dúvidas acerca da existência de área desapropriada pelo Município de Belo Horizonte. Conforme exposto em Ação Civil Pública do Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG) consta do registro de Imóvel juntado no processo quase nove mil metros quadrados que foram desapropriados da área da Granja Werneck para o Município de Belo Horizonte na década de 1990. É preciso que se apure onde se localiza esta área, agora pública.

4º) A juíza Luzia Divina não possui responsabilidade ética e moral para julgar os processos de reintegração de posse da Izidora. Uma magistrada que chama os ocupantes de “bandidos safados” e outras denominações pejorativas no intuito de criminalizar famílias pobres não está apta a captaras dimensões do conflito de forma a privilegiar o direito à cidade e à moradia adequada para milhares de famílias

5º) A 6ª Vara da Fazenda Pública Municipal é incompetente para julgar os processos da Izidora! Em Ação Civil Pública (ACP)ajuizada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG) fica demonstrado que parte da área em que as ocupações Rosa Leão, Vitória e Esperança estão localizadas nos municípios de Belo Horizonte e Santa Luzia. Nesse sentido, a competência para julgamento da ACP seria da 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual, unidade jurisdicional em que a ação foi distribuída e que atrairia a competência das reintegrações de posse (processos 0024.13.242.724-6,0024.13.313.504-6, 0024.13.304.260-6 e 0024.13.297.889-1) que correm na 6ª Varada Fazenda Municipal de titularidade da juíza Luzia Divina.

6º) Além disso, a competência para lidar com o direito à moradia é concorrente entre os entes federativos. E ainda há expressa previsão no Decreto Estadual nº 44.646/2007 que exige a participação do Governo de Minas Gerais em loteamento realizado em região limítrofe de municípios.

7º) Não consta nos processos de reintegração de posse documentos que delimitem a área litigiosa: metragem, localização, tipo.Não se sabe que parte da área está em Santa Luzia e qual parte exata é Zona Especial de Interesse Social (ZEIS) – AEIS 2, tampouco há memorial descritivo georreferenciado ou quaisquer referência precisa da área para cumprimento do mandado.

8º) Necessidade de um cadastro idôneo. O Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG) requisitou judicialmente a elaboração de cadastro socioeconômico para que fique claro quais as famílias estão no interior de área declarada pelo município de Belo Horizonte como Zona Especial de Interesse Social – AEIS 2, quais estão no território do município de Santa Luzia e quais estão cadastradas em programas de moradia.

9º) A liminar na Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais não foi apreciada pela juíza Luzia Divina. Há quase dois anos, após a propositura da ação, a magistrada deliberadamente está negando o direito fundamental à jurisdição ao não proferira decisão liminar.

10º) A Polícia Militar do Estado de Minas Gerais não possui capacidade alguma para executar ordem de reintegração de posse como foi reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em decisão do Ministro Og Fernandes disponível no seguinte link: https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/MON?seq=49519285&tipo=0&nreg=201501067185&SeqCgrmaSessao&CodOrgaoJgdr&dt=20150701&formato=PDF&salvar=false
11º) Denúncia com solicitação de medida cautelar junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) demonstra agravidade do caso devido ao alto número de pessoas colocadas em risco pela ação estatal. Não há possibilidade alguma de conciliar o despejo forçado com asdiretrizes internacionais de direitos humanos. A saber: Declaração Universal dos Direitos Humanos, Artigo XXV: 1; Pacto Internacional dos DireitosEconômicos, Sociais e Culturais: Artigo 11:1;  Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Interamericana de Direitos Humanos) prevê no art. 11-2, art. 22-1; Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP), Art. 17, § 1º;  Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, art. 5º, iii; Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher Art. 14, 2; Convenção sobre os Direitos das Crianças, Art. 16. 1; Princípios Básicos e Orientações para Remoções e Despejos Causados por Projetos de Desenvolvimento” da Relatoria Especial para o Direito à Moradia da ONU; Relatório da Relatoria Especial para o Direito à Moradia Adequada sobre Megaeventos de 2010 da Organização das Nações Unidas – ONU.

12º) Pessoas e empresas buscam se locupletar à custado patrimônio público! Estudos da cadeia dominial da Izidora mostram que a região que antes era terra pública foi repassada por gerações como propriedade privada de pessoas que nunca ali viveram ou trabalharam.

13º) Contratos de compra e venda feitos por via da pura especulação imobiliária! No Item V, Parágrafo Quinto, Letra “C.1” do Contrato de Financiamento, consta que a área negociada, onde serão construídos os apartamentos, tem 500.294,23m², e está sendo vendida (pela Granja Werneck S/A), por R$ 63.000,000,00 (sessenta e três milhões) de reais, conforme letra “B.2” do mesmo item V. O Contrato de financiamento foi assinado em 27.12.2013.No dia 14.01.2000, foi vendida “parte” da mesma Gleba e pela mesma Granja Werneck/proprietária, medindo 657.981,25 m2, por R$ 1.969.000,00 (Mat. 80.143, 5º Ofício Registro de Imóveis/BH).O tempo decorrido entre as duas vendas foi de 12 anos, porém, como não houve qualquer benfeitoria significativa na área, nem no seu entorno, entende-se que a segunda venda (500 mil metros) em relação   à primeira venda (657 mil metros), foi feita por valor 30 (trinta) vezes superior, o que, de princípio, não encontra qualquer justificativa. Em consultas especializadas sobre o assunto, a conclusão foi de que,na quase totalidade dos imóveis da região, construídos ou lotes vagos,praticamente não houve alteração de valor ou, aconteceram valorizações não significativas, o que sugere a necessidade de ser reexaminado o valor contratado (63 milhões de reais), em razão de que o pagamento está sendo feito com financiamento de dinheiro público(Programa Minha Casa Minha Vida - MCMV).

14º) Nulidade do contrato entre Caixa Econômica Federal (CEF), Bela Cruz Empreendimentos Imobiliários Ltda, Direcional Participações Ltda e Direcional Engenharia S.A! Dentre as condições suspensivas do contrato está a inviabilidade de se contratar novas unidades habitacionais em áreas que são objeto de litígio judicial em função de disputa fundiária. Nesse sentido, assinatura do referido contrato contrariou diretrizes nacionais sobre o MCMV já que a área estava há seis meses sob a posse das ocupações Rosa Leão, Esperança e Vitória quando da assinatura do contrato.

15º) Tentando justificar essa ilegalidade a CEF, em ofício, datado de 25 de agosto de 2014, endereçado ao Prefeito de Belo Horizonte, Márcio Lacerda (PSB), afirma: “As informações que nos foram repassadas até então era a de que uma possível realocação de moradores da área destinada ao empreendimento Granja Werneck, queo município deseja construir, era inferior a 160 famílias e que mesmo para essas o município estava negociando alternativas para uma desocupação pacífica.Com o objetivo de permitir que se pudesse ter uma finalização da negociação dessas menos de 160 famílias, foi demandado à CAIXA um prazo de até 31 de agosto de 2014. Diante doexposto, estamos prorrogando porprazo indeterminado e até o esclarecimento total dos fatos e regularização detodas as pendências nos sejam repassadas formalmente. A CAIXA esclareceque não tem qualquer objeção, inclusive em relação ao cancelamento doContrato.” Portanto, fica claro que a Prefeitura de Belo Horizonte(PBH), mentiu à Caixa Econômica Federal ao dizer que tinha abaixo de 160 famílias ocupando a área das Ocupações Vitória e Esperança. Desde o início das Ocupações em julho de 2013, as coordenações e os movimentos sociais estão afirmando que nas três ocupações da Izidora estima-se que existam cerca de 8.000 mil famílias.

16º) Um contrato que é gestado com recursos públicos milionários não pode ser executado por cima dos direitos de milhares de famílias. Por isso o instrumento deve ser cancelado ou no mínimo alterado para que a liberação desse recurso público para a Direcional esteja condicionado a readequação do empreendimento de forma a contemplar a proposta de negociação apresentada pelas famílias da Izidora. Tal proposta busca compatibilizar o interesse da construtora, a viabilização do empreendimento com as demandas das ocupações já consolidadas há dois anos.

17º) Há expressa violação da Portaria nº 317 do Ministério das Cidades que dispõe sobre medidas e procedimentos a serem adotados nos casos de deslocamentos involuntários de famílias de seu local de moradia provocados por programas soba gestão do Ministério das Cidades. Não há plano de Reassentamento e Medidas Compensatórias que assegure que as famílias afetadas tenham acesso a soluções adequadas para o deslocamento e para as perdas ocasionadas pela intervenção. O não atendimento ao disposto nesta Portaria, por parte do mutuário ou agente executor da intervenção, deverá ensejar a suspensão da liberação ou desembolso dos recursos dos contratos de financiamento ou termos de compromisso, pelo Ministério das Cidades ou por quem este delegar.

- Conforme parecer do professor José Luiz Quadros de Magalhães (link:http://ocupacaorosaleao.blogspot.com.br/2014/08/parecer-do-prof-dr-jose-luiz-quadros-de.html) há que se observar o seguinte diante do conflito da Izidora:

18º) Os princípios constitucionais devem prevalecer:“No caso, estamos diante de direitos que decorrem de princípios constitucionais fundamentais como a dignidade da pessoa; a integridade física e moral;  a segurança; a vida; a liberdade; a moradia, e outros destes decorrentes. São mais de 8.000 famílias, milhares de pessoas portadoras destes direitos inalienáveis que serão prejudicadas e terão seus direitos violados com esta decisão incompreensível, e que de tamanho o absurdo, é também imoral.”

19º) Uma decisão que implica em despejos é inconstitucional: “Na situação em tela, qual será a única decisão possível que preserve o sistema jurídico constitucional em sua integridade,ou seja: preserve a vida, a integridade física e moral destas mais de 8.000 famílias; preserve o seu direito de moradia, de dignidade, e ao mesmo tempo preserve o direito de propriedade? Certamente, uma decisão absolutamente inconstitucional, que destrói a integridade do Direito é a que implica nos despejos. Esta não tem nenhuma sustentação lógica constitucional além de ser imoral. Uma decisão deste teor deve gerar a responsabilização criminal do Juiz que a proferir.

20º) A única saída que preserva a integridade do Direito é a desapropriação: “Supondo que haja ainda um direito de propriedade a ser garantido, pois o direito deve ser exercido para que seja protegido, a única solução possível, que mantenha a integridade do sistema deve ser a que mantenha estas pessoas nos espaços e moradias que atualmente ocupam e se desaproprie a área pagando a indenização devida, caso contrário, estas pessoas só poderiam sair diante de uma negociação (jamais com o uso da força por tudo que foi explicado) onde lhes seja garantida moradia com dignidade e respeito, e sempre, a sua integridade física e moral.”

Sobre as 11 irregularidades acerca da Operação Urbana da Izidora veja nota do Indisciplinar no seguinte link: http://oucbh.indisciplinar.com/?page_id=822

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