Na Operação Urbana Simplificada do Isidoro (o nome correto é
Izidora, mulher negra escravizada e alforriada que lavava roupa no ribeirão que
ganhou seu nome) e nos quatro processos judiciais que envolvem diretamente
todas as famílias das Ocupações da Izidora, em Belo Horizonte e Santa Luzia,
MG, há 31 ilegalidades e inconstitucionalidades,que seguem sintetizadas a
seguir:
1º) Não foi comprovada a posse da área!Não é possível
juridicamente pedir reintegração de posse sem que nunca tenha sido exercida a
posse. É inclusive reconhecido amplamente o abandono centenário da região por
parte dos ditos proprietários, os quais somente fizeram juntar títulos de
propriedade cuja cadeia dominial encontra-se hoje alvo de severos
questionamentos.
2º) Não foi franqueado acesso aos autos das reintegrações
de posse para a Defensoria pública do Estado de Minas Gerais(DPE/MG) e
Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MP/MG) pela juíza Luzia Divina,
titular da 6ª Vara da Fazenda Pública Municipal da comarca de Belo Horizonte,
órgão onde correm as ações de reintegração de posse contra as famílias das
ocupações da Izidora. Assim ocorreu a inobservância dos princípios processuais
constitucionais da ampla defesa, do devido processo legal e do contraditório.
3º) Há sérias dúvidas acerca da existência de área desapropriada
pelo Município de Belo Horizonte. Conforme exposto em Ação Civil Pública do
Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG) consta do registro de Imóvel juntado
no processo quase nove mil metros quadrados que foram desapropriados da área da
Granja Werneck para o Município de Belo Horizonte na década de 1990. É preciso
que se apure onde se localiza esta área, agora pública.
4º) A juíza Luzia Divina não possui responsabilidade ética e
moral para julgar os processos de reintegração de posse da Izidora. Uma
magistrada que chama os ocupantes de “bandidos safados” e outras denominações
pejorativas no intuito de criminalizar famílias pobres não está apta a captaras
dimensões do conflito de forma a privilegiar o direito à cidade e à moradia
adequada para milhares de famílias
5º) A 6ª Vara da Fazenda Pública Municipal é incompetente para
julgar os processos da Izidora! Em Ação Civil Pública (ACP)ajuizada pelo
Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG) fica demonstrado que parte da área
em que as ocupações Rosa Leão, Vitória e Esperança estão localizadas nos
municípios de Belo Horizonte e Santa Luzia. Nesse sentido, a competência para
julgamento da ACP seria da 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual, unidade
jurisdicional em que a ação foi distribuída e que atrairia a competência das
reintegrações de posse (processos 0024.13.242.724-6,0024.13.313.504-6,
0024.13.304.260-6 e 0024.13.297.889-1) que correm na 6ª Varada Fazenda
Municipal de titularidade da juíza Luzia Divina.
6º) Além disso, a competência para lidar com o direito à moradia
é concorrente entre os entes federativos. E ainda há expressa previsão no
Decreto Estadual nº 44.646/2007 que exige a participação do Governo de Minas
Gerais em loteamento realizado em região limítrofe de municípios.
7º) Não consta nos processos de reintegração de posse documentos
que delimitem a área litigiosa: metragem, localização, tipo.Não se sabe que
parte da área está em Santa Luzia e qual parte exata é Zona Especial de
Interesse Social (ZEIS) – AEIS 2, tampouco há memorial descritivo
georreferenciado ou quaisquer referência precisa da área para cumprimento do
mandado.
8º) Necessidade de um cadastro idôneo. O Ministério Público de
Minas Gerais (MP/MG) requisitou judicialmente a elaboração de cadastro
socioeconômico para que fique claro quais as famílias estão no interior de área
declarada pelo município de Belo Horizonte como Zona Especial de Interesse
Social – AEIS 2, quais estão no território do município de Santa Luzia e quais
estão cadastradas em programas de moradia.
9º) A liminar na Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério
Público do Estado de Minas Gerais não foi apreciada pela juíza Luzia Divina. Há
quase dois anos, após a propositura da ação, a magistrada deliberadamente está
negando o direito fundamental à jurisdição ao não proferira decisão liminar.
11º) Denúncia com solicitação de medida cautelar junto à
Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) demonstra agravidade do caso
devido ao alto número de pessoas colocadas em risco pela ação estatal. Não há
possibilidade alguma de conciliar o despejo forçado com asdiretrizes
internacionais de direitos humanos. A saber: Declaração Universal dos Direitos
Humanos, Artigo XXV: 1; Pacto Internacional dos DireitosEconômicos, Sociais e
Culturais: Artigo 11:1; Pacto de San José da Costa Rica (Convenção
Interamericana de Direitos Humanos) prevê no art. 11-2, art. 22-1; Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP), Art. 17, § 1º;
Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial, art. 5º, iii; Convenção Sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação Contra a Mulher Art. 14, 2; Convenção sobre os Direitos
das Crianças, Art. 16. 1; Princípios Básicos e Orientações para Remoções e
Despejos Causados por Projetos de Desenvolvimento” da Relatoria Especial para o
Direito à Moradia da ONU; Relatório da Relatoria Especial para o Direito à
Moradia Adequada sobre Megaeventos de 2010 da Organização das Nações Unidas –
ONU.
12º) Pessoas e empresas buscam se locupletar à custado
patrimônio público! Estudos da cadeia dominial da Izidora mostram que a região
que antes era terra pública foi repassada por gerações como propriedade privada
de pessoas que nunca ali viveram ou trabalharam.
13º) Contratos de compra e venda feitos por via da pura
especulação imobiliária! No Item V, Parágrafo Quinto, Letra “C.1” do Contrato
de Financiamento, consta que a área negociada, onde serão construídos os apartamentos,
tem 500.294,23m², e está sendo vendida (pela Granja Werneck S/A), por R$
63.000,000,00 (sessenta e três milhões) de reais, conforme letra “B.2” do mesmo
item V. O Contrato de financiamento foi assinado em 27.12.2013.No dia
14.01.2000, foi vendida “parte” da mesma Gleba e pela mesma Granja
Werneck/proprietária, medindo 657.981,25 m2, por R$ 1.969.000,00 (Mat. 80.143,
5º Ofício Registro de Imóveis/BH).O tempo decorrido entre as duas vendas foi de
12 anos, porém, como não houve qualquer benfeitoria significativa na área, nem
no seu entorno, entende-se que a segunda venda (500 mil metros) em relação
à primeira venda (657 mil metros), foi feita por valor 30 (trinta) vezes
superior, o que, de princípio, não encontra qualquer justificativa. Em consultas
especializadas sobre o assunto, a conclusão foi de que,na quase totalidade dos
imóveis da região, construídos ou lotes vagos,praticamente não houve alteração
de valor ou, aconteceram valorizações não significativas, o que sugere a
necessidade de ser reexaminado o valor contratado (63 milhões de reais), em
razão de que o pagamento está sendo feito com financiamento de dinheiro
público(Programa Minha Casa Minha Vida - MCMV).
14º) Nulidade do contrato entre Caixa Econômica Federal (CEF),
Bela Cruz Empreendimentos Imobiliários Ltda, Direcional Participações Ltda e
Direcional Engenharia S.A! Dentre as condições suspensivas do contrato está a
inviabilidade de se contratar novas unidades habitacionais em áreas que são
objeto de litígio judicial em função de disputa fundiária. Nesse sentido,
assinatura do referido contrato contrariou diretrizes nacionais sobre o MCMV já
que a área estava há seis meses sob a posse das ocupações Rosa Leão, Esperança
e Vitória quando da assinatura do contrato.
15º) Tentando justificar essa ilegalidade a CEF, em ofício,
datado de 25 de agosto de 2014, endereçado ao Prefeito de Belo Horizonte,
Márcio Lacerda (PSB), afirma: “As
informações que nos foram repassadas até então era a de que uma possível
realocação de moradores da área destinada ao empreendimento Granja Werneck,
queo município deseja construir, era inferior a 160 famílias e que mesmo para
essas o município estava negociando alternativas para uma desocupação pacífica.Com o objetivo de permitir que se pudesse
ter uma finalização da negociação dessas menos de 160 famílias, foi demandado à
CAIXA um prazo de até 31 de agosto de 2014. Diante
doexposto, estamos prorrogando porprazo indeterminado e até o esclarecimento
total dos fatos e regularização detodas as pendências nos sejam repassadas
formalmente. A CAIXA esclareceque não tem qualquer objeção, inclusive em
relação ao cancelamento doContrato.” Portanto,
fica claro que a Prefeitura de Belo Horizonte(PBH), mentiu à Caixa Econômica
Federal ao dizer que tinha abaixo de 160 famílias ocupando a área das Ocupações
Vitória e Esperança. Desde o início das Ocupações em julho de 2013, as
coordenações e os movimentos sociais estão afirmando que nas três ocupações da
Izidora estima-se que existam cerca de 8.000 mil famílias.
16º) Um contrato que é gestado com recursos públicos milionários
não pode ser executado por cima dos direitos de milhares de famílias. Por isso
o instrumento deve ser cancelado ou no mínimo alterado para que a liberação
desse recurso público para a Direcional esteja condicionado a readequação do
empreendimento de forma a contemplar a proposta de negociação apresentada pelas
famílias da Izidora. Tal proposta busca compatibilizar o interesse da
construtora, a viabilização do empreendimento com as demandas das ocupações já
consolidadas há dois anos.
17º) Há expressa violação da Portaria nº 317 do Ministério das
Cidades que dispõe sobre medidas e procedimentos a serem adotados nos casos de
deslocamentos involuntários de famílias de seu local de moradia provocados por
programas soba gestão do Ministério das Cidades. Não há plano de Reassentamento
e Medidas Compensatórias que assegure que as famílias afetadas tenham acesso a
soluções adequadas para o deslocamento e para as perdas ocasionadas pela
intervenção. O não atendimento ao disposto nesta Portaria, por parte do
mutuário ou agente executor da intervenção, deverá ensejar a suspensão da
liberação ou desembolso dos recursos dos contratos de financiamento ou termos
de compromisso, pelo Ministério das Cidades ou por quem este delegar.
18º) Os princípios constitucionais devem prevalecer:“No caso,
estamos diante de direitos que decorrem de princípios constitucionais
fundamentais como a dignidade da pessoa; a integridade física e moral; a
segurança; a vida; a liberdade; a moradia, e outros destes decorrentes. São
mais de 8.000 famílias, milhares de pessoas portadoras destes direitos
inalienáveis que serão prejudicadas e terão seus direitos violados com esta
decisão incompreensível, e que de tamanho o absurdo, é também imoral.”
19º) Uma decisão que implica em despejos é inconstitucional: “Na
situação em tela, qual será a única decisão possível que preserve o sistema
jurídico constitucional em sua integridade,ou seja: preserve a vida, a
integridade física e moral destas mais de 8.000 famílias; preserve o seu
direito de moradia, de dignidade, e ao mesmo tempo preserve o direito de
propriedade? Certamente, uma decisão absolutamente inconstitucional, que
destrói a integridade do Direito é a que implica nos despejos. Esta não tem
nenhuma sustentação lógica constitucional além de ser imoral. Uma decisão deste
teor deve gerar a responsabilização criminal do Juiz que a proferir.
20º) A única saída que preserva a integridade do Direito é a
desapropriação: “Supondo que haja ainda um direito de propriedade a ser
garantido, pois o direito deve ser exercido para que seja protegido, a única
solução possível, que mantenha a integridade do sistema deve ser a que mantenha
estas pessoas nos espaços e moradias que atualmente ocupam e se desaproprie a
área pagando a indenização devida, caso contrário, estas pessoas só poderiam
sair diante de uma negociação (jamais com o uso da força por tudo que foi
explicado) onde lhes seja garantida moradia com dignidade e respeito, e sempre,
a sua integridade física e moral.”
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