Toda reintegração de
posse é destruição de casas e de sonhos: em memória dos despejos das Ocupações
Maria Vitória e Maria Guerreira, em Belo Horizonte, MG, dia 20/06/2016.
Por
frei Gilvander Moreira, da CPT.
Hoje,
dia 20 de junho de 2016, entrará para a história de Belo Horizonte, MG, como o
dia em que o TJMG, a prefeitura de BH (prefeito Márcio Lacerda, do PSB), o
Governo de MG (Pimentel, do PT), a PM de MG e a Guarda Municipal de BH fizeram
uma grande sexta-feira da paixão, não santa, na capital mineira. Cerca de 200
famílias das Ocupações Maria Vitória e Maria Guerreira, no bairro Copacabana,
zona norte de BH, foram despejadas sem nenhuma alternativa. O Estado cometeu
inúmeras injustiças, violências e violações aos direitos humanos. Listo algumas
abaixo:
A
dignidade humana, a função social da propriedade e o direito a moradia –
inscritos na Constituição Federal – foram violentados, porque o terreno estava
abandonado, sem cumprir sua função social e as cerca de 200 famílias em extrema
vulnerabilidade social foram para as Ocupações Maria Vitória e Maria Guerreira
porque não suportavam mais o peso da cruz do aluguel por falta de reforma
agrária, reforma urbana, injustiça social;
O
Novo Código de Processo Civil, que diz que ocupação com mais de 1 ano não pode
ser despejada sem audiência de conciliação e sem alternativa digna prévia para
as famílias. Inclusive o des. Alberto Diniz, do CEJUS, afirmou na TVC/BH que um
bom acordo para as ocupações Maria Vitória e Maria Guerreira estava sendo
firmado e que não iria despejar sem alternativa digna. Mas as famílias foram
jogadas na rua, no frio do mês de junho e no caminho da morte, pois na rua e no
frio muita gente adoecerá e, com o caos do SUS, poderão morrer, sim;
A
prefeitura de BH foi intransigente e não ofereceu nenhuma alternativa, mentiu
inclusive ao dizer para a imprensa que parte das famílias poderiam serem
acolhidas no Abrigo São Paulo, sendo que esse está superlotado e infestado de
percevejo, conforme denúncia do ex-frei Fernando, que vive nas ruas de BH, ao
Ministério Público na pessoa do Dr. Paulo César, da CIMOS;
A
Mesa de Negociação do Governo de MG também foi incapaz de oferecer pelo menos
um terreno para as famílias reconstruírem seus barracos;
O
Governo de MG autorizou a PM fazer o despejo com centenas de policiais
fortemente armados, cavalaria com enormes cavalos muito bem tratados, tropa de
choque, cachorros, GATE, dezenas viaturas todas novinhas, ao lado da Guarda
Municipal com dezenas de carros novinhos também. Dinheiro para investir no
aparato repressor o Estado tem, mas para construir moradia para o povo não tem.
Estado violentador do bem comum.
A
repórter Verônica Pimenta, da Rádio Inconfidência, foi presa de forma
arbitrária, ilegal e injusta, simplesmente porque cumpria sua missão: estava
gravando entrevista com alguma pessoa da Ocupação Maria Vitória. Várias pessoas
foram ameaçadas de prisão: frei Gilvander Moreira, Cleyton (assessor do dep.
Padre João), um fotógrafo das Brigadas Populares, uma funcionária da secretaria
dos Direitos Humanos do Governo de MG etc. A repórter foi conduzida em uma
viatura da PM para a 2ª delegacia. Frei Gilvander e Cleyton, testemunhas, foram
impedidos de ir junto com a repórter Verônica na viatura.
A
PM cercou toda a areia e não deixou ninguém entrar: nem imprensa e ninguém da
rede de apoio às ocupações. Eu, frei Gilvander, que segundo a Constituição
tenho o direito de prestar assistência espiritual, fui proibido de entrar na
ocupação Maria Vitória na parte da manhã e impedido de gravar em vídeo o
despejo na parte da manhã. Isso nunca tinha ocorrido em outros despejos.
Os
depoimentos das pessoas que estavam sendo despejadas são de cortar coração. Se
os juízes, os desembargadores, o prefeito, o governador, os policiais e os oficiais
de (in)justiça ouvissem os clamores das famílias e vissem suas lágrimas, se
tiverem consciência e coração humano, não farão mais despejos forçados.
Agora
à noite, os oficiais e a PM insistem em despejar inclusive uma área privada, ao
lado da Ocupação Maria Guerreira, para a qual não tem mandado judicial, segundo
os advogados do Coletivo Margarida Alves alegam.
Ao
despejar sem alternativa digna, o Estado fomenta a violência social, pois ao
ser violentada a pessoa se predispõe a ingressar na lógica da violência, o que
é lamentável.
Fizeram uma sexta-feira da paixão, mas
com a solidariedade de outras ocupações, das Brigadas Populares, do MLB e de
muitas pessoas de boa vontade, junto com os despejados construiremos uma
domingo de ressurreição com moradia própria e digna para todos/as na luta
coletiva. O Deus da vida nos anima nessa luta justa e necessária, pois ninguém
pode viver no ar. Como os pássaros precisam de ninhos, as famílias precisam de
moradia, direito sagrado e elementar. Lutaremos para que a Prefeitura de BH ou
o Governo de MG disponibilize um terreno em condições de acolher dignamente
todas as 200 famílias despejadas. E divulgaremos os vídeos feitos denunciando
as violências e exigiremos justiça.
Belo
Horizonte, MG, Brasil, início de noite do dia 20/06/2016, dia que foi noite na
capital mineira.
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